
Segundo Guilherme, o grupo de trabalho envolvido está escrevendo o anteprojeto após um amplo debate com a sociedade, tendo como principal canal o site Culturadigital. Após esta etapa de elaboração preliminar, o projeto será discutido em conjunto com os Ministérios da Cultura, Tecnologia e Comunicações, em sintonia com as questões ligadas às políticas públicas de acesso à banda larga. Nas discussões realizadas, em sua grande maioria, afirmou-se a necessidade da clareza dos direitos e deveres dos usuários, visando ser aprovado em um prazo relativamente curto, em consonância com a constituição federal vigente e preservando os princípios da rede enquanto espaço colaborativo.
Em seguida, Aldo Garcia (Coordenador da Unidade de Tecnologia da Informação e Comunicação da Secretaria de Gestão) falou sobre a importância do processo de discussão Marco Civil acontecer de forma orgânica, com os próprios usuários da rede, evitando se legislar sobre aquilo que não se conhece. Também observou que o Marco Civil acontece contemplando as transformações internacionais, concordando com os princípios de governança, liberdade, neutralidade, etc. Acrescentou ainda que cerca de 35% dos usuários da rede já tiveram algum tipo de problema relacionado à segurança, exigindo grandes investimentos e que o Marco Civil irá contribuir para amenizar este problema, o que, por sua vez, não significa cercear as liberdades individuais.
Sérgio Amadeu (sociólogo e ativista por direitos civis na internet) iniciou sua intervenção falando sobre o caráter colaborativo, descentralizado e continuamente metamórfico da rede, enquanto pressupostos indissociáveis de sua existência. Observou uma certa “satanização” da rede pela grande mídia, visando o controle de quem está navegando. Criticou a miopia do senador Eduardo Azeredo (PSDB) que ignora os preceitos básicos da rede ao tentar regulá-la, desconsiderando o seu caráter internacional e o funcionamento de seus protocolos. Também observou que os ataques contemporâneos ao anonimato na rede servem, em última instância, aos interesses do que chamou de “Industria do Copyright”. Nesta linha de raciocínio, discorreu sobre as diferenças nos processos de medição de audiência da TV e da internet. Diferente da primeira (que é feita por amostragem), esta última permite que seja exercido – por meio do mapeamento do fluxo de informações – um controle direto sobre os usuários. Finalizou observando que o anonimato é vital para a garantia da internet, ao menos do modo como nós a conhecemos hoje.
Ivo Correa (Diretor de Políticas Públicas e Relações Governamentais do Google Brasil) questionou: regular ou não a internet? Observou que os usuários, com razão, temem que uma regulação da internet venha destruir alguns de seus princípios. Contudo, destacou que este é um movimento internacional, do qual as pessoas não podem se omitir ao debate, sob o risco de colocá-la nas mãos daqueles que não respeitam os seus pressupostos imanentes, cujo desenho encontra-se nos seus códigos de funcionamento e na relativa auto-regulação já existente. Observou também que a legislação vigente foi criada em um momento em que a rede não existia, tratando-se então de trazer as leis para o mundo contemporâneo, no contexto da realidade brasileira.
Para Ivo é necessário que sejam definidas regas claras de participação, tendo em vista que a grande maioria das empresas de internet (intermediários de acesso e conteúdo), para se desenvolverem, por questões diversas, encontram enormes riscos de investimento, inibindo a criação de pequenas empresas inovadoras. Garantir a liberdade de abertura de empreendimentos, independente do poder econômico, traduz um dos os direitos fundamentais para internet. O Marco Civil, nesse sentido, ajudaria a fomentar o mercado de internet, atuando como um motor da inovação e não uma barreira. Destacou ainda a dificuldade de alcançar um equilíbrio entre os interesses envolvidos, sobretudo em um ano eleitoral.
Finalizando a mesa, Ronaldo Lemos (FGV/Rio) discorreu sobre o processo de elaboração das leis, destacando que a instituição do Marco Civil contribui para uma mudança no modo de se fazer política, ou seja, de forma colaborativa, junto à sociedade. Argumentou que a primeira fase do processo (elaboração de princípios norteadores) contou com mais de 800 comentários de alto nível, além da participação de diversas instituições como a ABERT, ABRANET, Partido Pirata, FECOMERCIO, IASP, IDEC, IPAE, OAB, dentre outras. Detalhando a metodologia na redação do texto, Ronaldo explicou que toda a legislação precedente ao Marco Civil foi estudada, além de todas as leis que vieram na esteira deste processo. Destacou que foram descartadas quaisquer formas de identificação direta dos usuários, garantindo a privacidade do usuário e que, apesar da constituição negar o anonimato na exposição de opiniões, o acesso às informações permanecerá anônimo. Concluiu observando que o Marco Civil não é um processo ambicioso, tendo em vista que deixou de lado as questões ligadas ao direito autoral.
Com a abertura do debate ao público, questionei sobre a importância do Marco Civil do Brasil para a internet mundial e em que medida ele poderia influenciar a elaboração de leis semelhantes em outros países. Os debatedores responderam que Marco Civil no Brasil já está sendo monitorado por grandes corporações e diversos atores da rede e que o mesmo terá grande impacto internacional, sobretudo para os países em desenvolvimento, como os da América Latina e da África, além de contemplar avanços já estabelecidos em outros países.