O que está em jogo na reforma do Direito Autoral? – Campus Party

Na quarta-feira (27/01), no Campus Fórum, aconteceu a mesa “O que está em jogo na reforma do Direito Autoral”. José Vaz (MinC), discorrendo sobre a história do direito autoral, questionou se ele não havia se tornado excessivamente contrário aos seus objetivos originais: a saber, aquele de proteger o autor. Na prática o direito autoral sobre as obras não é exercido pelo autor, mas por um reduzido número de empresas. Enfatizou que a discussão dos direitos autorais está diretamente ligada às questões relativas aos direitos humanos, cuja discussão é feita em âmbito internacional e que, comparativamente, a lei brasileira beiraria ao absurdo, sendo considerada uma das piores do mundo. Concluiu observando que o direito autoral no Brasil prejudica os criadores, uma vez que estes são obrigados a recorrerem aos intermediários, sempre em desvantagem.
Camila Jimene (Opice Blum Advogados) questionou como podemos adaptar as leis às necessidades contemporâneas, tendo em vista que esses ajustes levam tempo, sobretudo porque o direito não avança na mesma velocidade da tecnologia. Outra questão é que as decisões em torno do direito autoral (em âmbito internacional) são tratadas de forma nebulosa e que a revisão da lei de maneira mais abrangente não será, certamente, uma discussão fácil.
Gustavo Anitelli (Teatro Mágico e MPB) relatou sua experiência pessoal, observando que ficaram meia década procurando gravadoras e mais meia fugindo delas. Hoje o ECAD, explica, cobra de todas as rádios, mas os processos de retorno para os autores são obscuros. Defendeu a não liberação de subsídeos públicos para músicos que pagam “jabá”, os quais começam inclusive a ser cobrados na internet. Afirmou que o direito autoral tem servido para manter um sistema monopolista que bloqueia o desenvolvimento artístico, sendo necessário pensá-lo do ponto de vista público por meio da formulação de leis que dialoguem com a sociedade.
Em seguida, Luiz Moncau (Centro de Tecnologia e Sociedade da FGV Direito Rio) abriu sua fala observando que “a lei de direito autoral no Brasil é uma das 5 mais rígidas do mundo”. Questionou se ao invés de falarmos em “pirataria” não seria a hora de se fazer um debate mais maduro em torno desta questão, tendo em vista que a lei não pode criminalizar toda a população. Argumentou se os direitos autorais brasileiros iriam possibilitar o surgimento de algo como o YouTube no Brasil, sugerindo que as leis restritivas inviabilizariam a postagem de vídeos proprietários. Segundo ele, as leis não podem ser um entrave para o desenvolvimento da tecnologia. Por outro lado, o direito autoral também não pode ser um entrave para o desenvolvimento econômico. Fez elogios a Gilberto Gil por ter reunido no MinC pessoas interessadas em debater o direito autoral e que, até então, estavam esquecidas e dispersas na sociedade civil. Uma parte importante de sua fala foi relacionada aos entraves educacionais das leis de direito autora. Na sua opinião, o Ministério da Educação deveria fazer o mesmo tipo de pressão que fez o MinC.
A última fala foi do roteirista Leandro Vieira Maciel (do filme “Dossiê Rebordosa”). Leandro tem cerca de oito anos de carreira, trabalhou como co-roteirista para as séries “Cidade dos Homens” (Globo) e para a estadunidense “9 milímetros” (Fox), sendo obrigado a lidar com as questões do direito autoral. Afirmou que nas duas séries em que atuou, teve que assinar contrato de cessão de direitos autorais de seu roteiro, e que isso é uma regra do mercado audiovisual. A maioria dos roteiristas recebem cachê, mas não pela transmissão ou venda de sua obra. Isso fez com que ele não recebesse os royalties dos futuros rendimentos das séries. Além disso ser um problema para o financiamento dos roteiristas, ele acredita que seja maléfico para a classe, por tirar a autoria das mãos dos roteiristas. Segundo ele, quem é dono da peça audiovisual é o diretor e não o roteirista. Indicou o site da ARTV (Associação Brasileira de Roteiristas Profissionais de TV, Cinema e outros Meios de Comunicação), para ter mais informações sobre a atuação política dos roteiristas na área do direito autoral. Disse que lá existe um manifesto dos roteiristas europeus e uma declaração mundial dos autores-roteiristas, lançado na I Conferência Mundial de Autores-Roteiristas que aconteceu em Atenas. Esse manifesto versa sobre a questão da autoria da obra audiovisual, do reconhecimento moral do trabalho do roteirista e do fim da cessão de direitos autorais. Por fim, posicionou-se a favor do trabalho colaborativo, a exemplo do realizado na série “9 milímetros”.
Com a abertura do debate ao público, José Vaz foi questionado sobre a viabilidade das reivindicações educacionais serem incluídas no ante-projeto de direito autoral ao que ele respondeu que a sociedade civil deveria pressionar e levar suas indicações para o Ministério da Cultura para que ele seja tratado de uma forma mais aprofundada. Ele acha que os usos educacionais das obras estão muito mal tratadas na lei atual e na proposta da nova lei. Um exemplo dado foi sobre o ensino à distância, que trata-se de uma exposição ao público, devendo ser de alguma forma discutida no texto. Disse ainda que a questão das cópias de livros didáticos para fins educacionais sem fins lucrativos deveriam ter sido mais discutidas na reforma da lei. Contudo, ele entende que ser ainda possível que os setores educacionais discutam, se articulem e levem suas reivindicações para o Congresso Nacional, onde o ante-projeto será mais uma vez discutido, após a consulta pública. Disse que isso é importante e estratégico, pois as editoras já estão se articulando a favor de uma lei mais rígida, principalmente visando o mercado editorial. Outra pergunta interessante foi sobre a adoção de licenças livres pelos criadores, o que, na opinião de Jimene, tratar-se-ia de uma opção do autor, mas que o Estado deveria incentivar sua adoção.
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